À
BEIRA DE UMA GUERRA NUCLEAR
(Pela
segunda vez)
“Acima
de tudo, enquanto defendemos nossos próprios interesses vitais, as
potências nucleares devem evitar os confrontos que levam o
adversário a escolher entre uma retirada humilhante ou uma guerra
nuclear. Adotar esse movimento na era nuclear evidencia apenas a
falência de nossa política – ou o desejo coletivo de morte para o
mundo”
(John
F. Kennedy – Presidente dos USA)
Estas
palavras do Presidente dos Estados Unidos da América são, hoje,
mais clarividentes do que então. E ele sabia do que estava a falar,
pois esteve à beira de dar início a uma guerra nuclear ao exigir
que a Rússia, então parte da União Soviética, retirasse os
misseis nucleares que estavam prestes a ser instalados em Cuba.
Também
na altura se poderia colocar a questão de os Estados Unidos terem o
direito de intervirem num estado soberano como era Cuba. Contudo,
para Kennedy essa questão não se colocava, pois misseis colocados a
menos de 5 minutos de Washington DC era impensável pois comprometia
gravemente a segurança existencial da Federação Americana.
A
União Soviética recuou e foram firmados vários acordos,
nomeadamente o de não agressão contra Cuba por parte dos Estados Unidos.
Há
quem veja nesta reação dos Estados Unidos semelhanças com a reação
da Federação Russa relativamente ao que hoje se passa na Ucrânia,
acrescido do facto de nos territórios em que a guerra se trava a
população ser esmagadoramente Russa ou de origem Russa.
No
momento em que escrevo estas linhas o Presidente Russo discursa e
ameaça com o uso de armas nucleares acopladas em misseis balísticos
supersónicos contra os quais nem os Estados Unidos nem a Europa têm
capacidade de os destruir antes de atingirem os alvos.
já
em 2003 um artigo artigo publicado na primeira página do “New York
Times”, assinado por quinze especialistas em segurança, reunidos
pela “Eisenhower Media network” abordava esta questão e
terminava apelando:
VAMOS
FAZER DA AMÉRICA UMA FORÇA PARA A PAZ NO MUNDO
Nem
que seja pela força, digo eu
A
Guerra Rússia-Ucrânia é um desastre absoluto
TEXTO
COPIADO DO FACEBOOK DE JORGE FAEL
(Ver AQUI)
24
DE MAIO DE 2023
Por
VÁRIOS AUTORES*
ARTIGO
PUBLICADO NA PRIMEIRA PÁGINA DO “NEW YORK TIMES”, ASSINADO POR
QUINZE ESPECIALISTAS EM SEGURANÇA REUNIDOS PELA “EISENHOWER MEDIA
NETWORK”
“A
Guerra Rússia-Ucrânia é um desastre absoluto. Centenas de milhares
de pessoas foram mortos ou feridos. Milhões foram deslocadas. A
destruição ambiental e econômica tem sido incalculável. A
devastação futura pode ser ainda maior à medida que as potências
nucleares se aproximam cada vez mais da guerra aberta.
Lamentamos
a violência, os crimes de guerra, os ataques indiscriminados com
mísseis, o terrorismo e outras atrocidades que fazem parte desta
guerra. A solução para essa violência chocante não é mais armas
ou mais guerra, com a garantia de mais mortes e destruição.
Como
americanos e especialistas em segurança nacional, instamos o
presidente Joe Biden e o Congresso a usar de seus poderes para
encerrar a Guerra Rússia-Ucrânia rapidamente, por meio da
diplomacia, principalmente por conta dos graves perigos de uma
escalada militar que pode sair do controle.
Sessenta
anos atrás, o presidente John F. Kennedy fez uma observação que é
crucial para a nossa sobrevivência hoje: “Acima de tudo, enquanto
defendemos nossos próprios interesses vitais, as potências
nucleares devem evitar os confrontos que levam o adversário a
escolher entre uma retirada humilhante ou uma guerra nuclear. Adotar
esse movimento na era nuclear evidencia apenas a falência de nossa
política – ou o desejo coletivo de morte para o mundo”.
A
causa imediata desta guerra desastrosa na Ucrânia é a invasão da
Rússia. No entanto, os planos e ações para expandir a OTAN para as
fronteiras da Rússia serviram para provocar os temores russos. Os
líderes russos defenderam esse ponto por 30 anos. Uma falha na
diplomacia levou à guerra. Agora a diplomacia é urgentemente
necessária para acabar com a Guerra Rússia-Ucrânia antes que ela
destrua a Ucrânia e coloque a humanidade em perigo.
O
POTENCIAL PARA A PAZ
A
atual ansiedade geopolítica da Rússia é informada pelas memórias
das invasões de Carlos XII, Napoleão, Kaiser e Hitler. As tropas
dos EUA participaram da força de invasão aliada que interveio sem
sucesso contra o lado vencedor na guerra civil na Rússia logo após
a Primeira Guerra Mundial. A Rússia vê o alargamento e a presença
da OTAN nas suas fronteiras como uma ameaça direta; os EUA e a OTAN
consideram que se trata apenas de uma preparação prudente. Na
diplomacia, deve-se procurar ver com empatia estratégica, buscando
compreender os adversários. Isso não é fraqueza: é sabedoria.
Rejeitamos
a ideia de que os diplomatas, em busca da paz, devam escolher um
lado, neste caso, a Rússia ou a Ucrânia. Ao favorecer a diplomacia,
escolhemos o lado da sanidade. Da humanidade. Da paz.
Consideramos
a promessa do presidente Joe Biden de apoiar a Ucrânia “pelo tempo
que for necessário” uma licença para perseguir objetivos mal
definidos e, em última análise, inatingíveis. Pode ser tão
catastrófico quanto foi a decisão do presidente Vladimir Putin no
ano passado de lançar essa invasão e ocupação criminosas. Não
podemos e não iremos endossar a estratégia de lutar contra a Rússia
até o último ucraniano.
Defendemos
um compromisso significativo e genuíno com a diplomacia,
especificamente um cessar-fogo imediato e negociações sem quaisquer
pré-condições desqualificantes ou proibitivas. Provocações
deliberadas resultaram na Guerra Rússia-Ucrânia. Da mesma forma, a
diplomacia pode acabar com isso.
AÇÕES
DOS EUA E INVASÃO DA UCRÂNIA PELA RÚSSIA
Com
o colapso da União Soviética e o fim da Guerra Fria, os líderes
dos Estados Unidos e da Europa Ocidental garantiram aos líderes
soviéticos e russos que a OTAN não se expandiria em direção às
fronteiras da Rússia. “Não haveria extensão da OTAN uma polegada
a leste”, disse o secretário de Estado dos EUA, James Baker, ao
líder soviético Mikhail Gorbachev em 9 de fevereiro de 1990.
Garantias semelhantes de outros líderes dos EUA, bem como de líderes
britânicos, alemães e franceses foram dadas na década de 1990.
Desde
2007, a Rússia advertiu repetidamente que a presença das forças
armadas da OTAN nas fronteiras russas era intolerável – assim como
as forças russas no México ou no Canadá seriam intoleráveis para
os EUA agora, ou como foram os mísseis soviéticos em Cuba em 1962.
A Rússia destacou ainda que a expansão da OTAN para a
Ucrânia era especialmente provocativa.
VENDO
A GUERRA PELOS OLHOS DA RÚSSIA
Nossa
tentativa de entender a perspectiva russa em sua guerra não endossa
a invasão e a ocupação, nem implica que os russos não tiveram
outra opção a não ser esta guerra. Entretanto, assim como a Rússia
tinha outras opções, os EUA e a OTAN também tinham antes desse
momento.
Os
russos deixaram claras suas linhas vermelhas. Na Geórgia e na Síria,
eles provaram que usariam a força para defender essas linhas. Em
2014, sua tomada imediata da Crimeia e seu apoio aos separatistas de
Donbas demonstraram que eles estavam comprometidos com a defesa de
seus interesses. Por que isso não foi entendido pela liderança dos
EUA e da OTAN não está claro: incompetência, arrogância, cinismo
ou uma mistura traiçoeira dos três provavelmente foram os fatores
decisivos.
Mais
de uma vez, mesmo com o fim da Guerra Fria, os diplomatas, generais e
políticos dos EUA alertaram para os riscos de expandir a OTAN para
as fronteiras da Rússia e de interferir em sua área de influência.
Os ex-funcionários do gabinete Robert Gates e William Perry emitiram
essas advertências, assim como os venerados diplomatas George
Kennan, Jack Matlock e Henry Kissinger. Em 1997, cinquenta
especialistas seniores em política externa dos EUA escreveram uma
carta aberta ao presidente Bill Clinton aconselhando-o a não
expandir a OTAN, chamando-o de “um equívoco político de
proporções históricas”. O presidente Bill Clinton optou por
ignorar esses avisos.
O
mais importante para nossa compreensão da arrogância e do cálculo
maquiavélico na tomada de decisões dos EUA em torno da Guerra
Rússia-Ucrânia é a rejeição das advertências emitidas por
Williams Burns, o atual diretor da Agência Central de Inteligência.
Em um telegrama para a secretária de Estado Condoleezza Rice em
2008, enquanto servia como embaixador na Rússia, Burns escreveu o
seguinte sobre a expansão da OTAN e a adesão da Ucrânia: “As
aspirações da Ucrânia e da Geórgia à OTAN não apenas tocam um
ponto sensível na Rússia, como também geram sérias preocupações
sobre as consequências para a estabilidade na região. A Rússia não
apenas percebe o cerco e os esforços para minar a influência da
Rússia na região, mas também teme consequências imprevisíveis e
descontroladas que afetariam seriamente os interesses de segurança
russos. Especialistas nos dizem que a Rússia está particularmente
preocupada que as fortes divisões na Ucrânia sobre a adesão à
OTAN, com grande parte da comunidade de etnia russa contra a adesão,
possam levar a uma grande divisão, envolvendo violência ou, na pior
das hipóteses, guerra civil. Nessa eventualidade, a Rússia teria
que decidir se iria intervir; uma decisão que a Rússia não quer
ter que enfrentar”.
Por
que os EUA persistiram em expandir a OTAN, apesar dessas
advertências? O lucro das vendas de armas foi um fator importante.
Enfrentando a oposição à expansão da OTAN, um grupo de
neoconservadores e altos executivos de fabricantes de armas dos EUA
formaram o “Comitê dos EUA para Expandir a OTAN”. Entre 1996 e
1998, os maiores fabricantes de armas gastaram US$ 51 milhões (US$
94 milhões hoje) em lobby e outros milhões em contribuições de
campanha. Com esta generosidade, a expansão da OTAN rapidamente se
tornou um negócio lucrativo. Os fabricantes de armas dos EUA
venderam bilhões de dólares em armas aos novos membros da OTAN.
Até
agora, os EUA enviaram US$ 30 bilhões em equipamentos militares e
armas para a Ucrânia, com uma ajuda total à Ucrânia superior a US$
100 bilhões. A guerra, já foi dito, é altamente lucrativa para
alguns poucos.
A
expansão da OTAN, em suma, é uma característica fundamental da
política externa militarizada dos EUA, caracterizada pelo
unilateralismo com mudanças de regimes políticos e guerras
preventivas. Guerras fracassadas, mais recentemente no Iraque e no
Afeganistão, produziram massacres e mais confrontos, uma dura
realidade criada pelos próprios Estados Unidos. A Guerra
Rússia-Ucrânia abriu uma nova arena de confronto e matança. Esta
realidade não é inteiramente de nossa autoria, mas pode muito bem
ser nossa ruína, a menos que nos dediquemos a forjar um acordo
diplomático que interrompa a matança e diminua as tensões.
VAMOS
FAZER DA AMÉRICA UMA FORÇA PARA A PAZ NO MUNDO.”
Ler
mais em AQUI:
AUTORES:
*Dennis
Fritz é diretor da Eisenhower Media Network. Sargento Chefe do
Comando da Força Aérea dos EUA (aposentado).
*Matthew
Hoh é diretor associado da Eisenhower Media Network. Ex-oficial do
Corpo de Fuzileiros Navais e oficial do Estado e da Defesa.
*William
J. Astore é tenente-coronel da Força Aérea dos EUA (aposentado).
*Karen
Kwiatkowski é tenente-coronel da Força Aérea dos EUA (aposentado).
*Dennis
Laich é major-general do Exército dos EUA (aposentado).
*Jack
Matlock, embaixador dos EUA na URSS, 1987-91, é autor do livro
Reagan e Gorbachev: Como acabou a Guerra Fria.
*Todd
E. Pierce é Major, Juiz Advogado, Exército dos EUA (aposentado).
*Coleen
Rowley é Agente Especial, FBI (aposentado).
*Jeffrey
Sachs, é professor na Universidade de Columbia.
*Christian
Sorensen, é especialista em língua árabe.
*Chuck
Spinney é membro da Força Aérea dos EUA, Engenheiro/analista
aposentado no Gabinete do Secretário de Defesa.
*Winslow
Wheeler, conselheiro de segurança nacional de quatro estados
republicanos e democratas.
*Lawrence
B. Wilkerson é Coronel do Exército dos EUA (aposentada).
*Ann
Wright é Coronel do Exército dos EUA (aposentada) e ex-diplomata.
Tradução:
Benito Mazzi de Araújo.
Publicado
originalmente em Eisenhower Media Network (Ver
AQUI)